6 de out. de 2012

Para um homem em um caixão

Porque você é um homem em um caixão, eu te desejo por perto. Quero porque não posso e me deito morna com olhos de torpor, fico frouxa, amoleço, esmoreço. Inquieto e você ri e explica que queria, me visita. Beija.

E porque eu sou uma menina que tem um homem em um caixão eu me esgueiro, sento em seu lado, como filha de vó, que tem um laço no vestido. Aquelas filhas que nós tínhamos escárnio. Riamos. E como uma legítima digna de troça, reajo: peço por favor, porfavorzinho, o seu auxílio. O seu asilo. Mereço desdém.

E eu fico é muito da irritada com esse espólio que me deixou. Amarro a cara e bato pé e tenho certeza que desaprova, como naquele dia que saí para beber - e não era nem refrigerante - e encontrei semi conhecidos seus. Não disse nada seu porque sou bem adestrada, mas tive é vontade de cutuca-los no rosto para me fazer reconhecida, merecer suas saudações condoídas, ouvir os pêsames e viver aquele dilema: se agradece ou se consente?

E toda vez que vou pro lugar que vamos, ou íamos, refaço os passos e olho pro chão para ver se deixamos alguma coisa caída da última visita, sempre sou tão distraída. Depois de não achar nada olho pro céu: tem aves. Migalhas de João nunca sobram para a volta da viagem. Eu choro, Maria que é, vem e consola: me dá doce, porque engorda e depois me taca no fogão, me assa, mas ainda estou crua por dentro.

Para você que é um homem no caixão, tenho um aceno eterno, no portão, na festa, na escola, na guarita, no olhar quando escondida fazendo birra, na piscina, na beira na cama, na voz que já não te chama, na voz que proclama morte ou independência! Sou tão independente agora, infelizmente.


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